Humildade, perseverança, estudo e dedicação são as marcas de João Alves Melo

Presidente da ACAD fala sobre administração, história de vida e como ele chegou ao topo da carreira

Atual presidente da Academia Cearense de Administração (Acad), e doutor em Gestão nas Organizações de Empresas, o administrador João Alves de Melo é o entrevistado desta edição da Revista Brasileira de Administração (RBA).

Funcionário de carreira do Banco do Nordeste do Brasil (BNB), Melo passou por cargos como caixa, chefe de setor e gerente, até chegar à presidência do banco, em 1992. Atualmente, também é professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece).

Entrevista

RBA: Professor, qual seria hoje o maior desafio para um administrador, sobretudo, um administrador público?

João Alves: Olha, o administrador público tem um campo de atuação imenso, porque praticamente se construiu muito pouco nessa área. A administração pública, no Brasil, ainda tem um viés muito forte, ela trabalha olhando dois eixos, a política e a gestão. É difícil você conseguir operar com eficiência e eficácia recursos escassos, olhando esses dois eixos e fazendo o atendimento daquele que vem através do eixo político. Dificilmente, você consegue ser eficiente. E, naturalmente, para você vencer isso é preciso mudança de cultura.

O senhor é doutor em Gestão e Organização de Empresas. Quais são os principais erros de cultura organizacional nas empresas, sobretudo, nas instituições públicas?

Com relação às organizações públicas, eu digo que este é um erro de origem. Começou-se a pensar no Brasil - isso nas três esferas de governo, federal, estaduais e municipais - que aquilo que deveria prevalecer no encaminhamento da gestão era o pensamento político. Quanto ao pensamento político, eu não digo que é de todo errado fazer política na administração pública. Pelo contrário, sem a política a gente não caminha. É importante a existência da política para que a gente possa caminhar bem. Mas se, por exemplo, misturar as duas coisas quem será escolhido para ser gestor? É o amigo do rei!

Quando o senhor fala em formação, seria a capacitação profissional?

Isso mesmo, a capacitação profissional é o eixo de correção. E é por isso que eu digo que os novos tempos dos Conselhos de Administração estão nos levando a isso. Já há o reconhecimento da importância da profissionalização para o crescimento na administração. O Ceará, por exemplo, já está oferecendo cursos de atualização para todos aqueles que queiram crescer profissionalmente.

Ainda sobre administração pública, os conceitos de eficiência e eficácia são diferentes. Qual é a diferença entre esses dois conceitos, e o que é preciso para obter o máximo de eficiência e eficácia nos processos de trabalho, sobretudo, na administração pública?

São bem diferentes. Esses dois conceitos a gente poderia até dar um exemplo, aqui, para a pessoa entender o que é eficiência e que é eficácia. Por exemplo, alguém quer perfurar um poço. Procura um profissional que efetivamente sabe perfurar poço, faz aquilo dentro do prazo desejado e executa a perfuração do poço. Então, isso é eficiência. Executou, objetivamente, num prazo determinado. Mas, se você quer ter eficácia, você tem que procurar um profissional que saiba onde é que tem água, porque não adianta perfurar poço sem água. Faça primeiro um estudo para saber onde é que tem água, analise a qualidade dessa água e veja se ela atinge objetivamente aquilo que se deseja. E, depois, soma a primeira a essa segunda parte, e aí você tem eficácia. Quer dizer, você não apenas entregou o produto, você entregou o produto na qualidade desejada. Naturalmente, isso com conhecimento de causa, fruto de uma formação que efetivamente se exigiu para que você chegasse a esse resultado. Ainda tem um terceiro ponto, é a efetividade. Efetividade é exatamente a entrega do produto certo, de acordo com o objetivo visado. Então, você tem esses três eixos, eles são complementares.

Qual dos três é mais deficiente na administração pública?

Eu diria que na administração pública os três são deficientes. Nem temos eficiência, nem eficácia, nem efetividade. Perdemos muito recurso por conta disso. Quando você não conhece bem o objetivo daquilo onde você vai aplicar, e nem tem um planejamento de prioridade para saber se aquela é a prioridade maior, então você vai entregar um produto errado. Porque não teve planejamento participativo, não procurou saber o que a população deseja em primeiro lugar. Então, não foi eficiente, não foi eficaz e não foi efetivo.

O que falta para o Brasil chegar a um nível alto de excelência na Administração?

Falta aí mais a formação do gestor. Gestores com formação e visão de futuro, e direcionamento do esforço para chegar àquilo. Então, nós não temos esse tipo de profissional na gestão pública. No setor privado, nós temos também algumas deficiências. Vou citar uma delas: as empresas brasileiras, de um modo geral, foram no passado empresas familiares e, muitas delas, se conservam como tal, vai passando de pai para filho. Então, a empresa familiar tem um viés negativo que é fazer uma gestão autocrata.

Na gestão autocrata, só o número um toma a decisão, só o número um sabe o que é bom. Isso não existe em administração. Administração é diálogo, é reunião, é discussão, é debate, é buscar o melhor caminho, porque são muitas cabeças pensando. E como ela não faz isso, tem outro viés terrível. O empresário brasileiro acredita que tudo, todos os seus investimentos, têm que ter retorno em curto prazo. A visão do mundo é completamente diferente dessa. O investimento retornará do médio para o longo prazo.

O futuro da administração é o empreendedorismo?

Como ficaria a tecnologia nesse processo? As duas palavras se completam. Uma atua para melhorar um segmento, e a outra para dar qualidade a esse segmento. Como, por exemplo, o empreendedorismo é importante?

Ele é importantíssimo. Sem o empreendedorismo você não terá diversificação e nem terá crescimento da economia nos vários segmentos que precisam crescer. Sem o empreendedorismo, você não sabe para onde ir, porque você não tem conhecimento daquilo e nem tem certeza de que aquilo possa efetivamente lhe dar bom retorno.

Tecnologia ajuda a chegar mais rápido àquilo que se deseja e, às vezes, até traz mais qualidade ao produto. Quanto mais tecnológico, melhor a qualidade deste produto.

Não podemos mais viver no século 21, numa economia puramente manual. Então, nós temos que viver em uma economia tecnológica, de crescimento, de absorção de novas tecnologias, e aceitar que nós estamos caminhando rapidamente para mais uma revolução mundial, que é a inteligência artificial. Isso está chegando. Não é coisa do futuro lá distante, vai chegar já, já. E isso vai mexer nas profissões, vai mexer com tudo.

Fonte: Revista RBA

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